À Espera de Um Milagre foi o primeiro romance de Stephen King que li. Na época, eu não sabia muita coisa a respeito do autor e nem que ele era considerado por muitos o mestre do terror. Agora, depois de alguns anos e após ter conhecido uma parte do multiverso King, decidi reler essa obra e cheguei à conclusão de que ela sempre foi a minha favorita.
Na trama, acompanhamos o relato em primeira pessoa de Paul Edgecombe. Ele trabalhava como chefe dos guardas no Corredor da Morte da penitenciária de Cold Mountain. Décadas mais tarde, enquanto vive em um lar para idosos, Paul decide escrever suas memórias sobre o que aconteceu em 1932, durante a Grande Depressão, quando John Coffey foi deixado aos seus cuidados após ser condenado à cadeira elétrica pelo estupro e assassinato de duas gêmeas de nove anos. Contudo, Coffey não era um preso comum, possuindo inexplicáveis dons sobrenaturais. A partir dali Edgecombe viu muitas de suas crenças serem abaladas e só na velhice reuniu coragem para falar sobre isso.
Por ser a narrativa de um idoso, nem sempre ela segue uma linearidade ou a ordem cronológica dos acontecimentos. É frequente que Paul fale sobre fatos que aconteceram antes da chegada de Coffey ao Corredor e que logo em seguida acrescente informações sobre o que ocorreu após sua passagem por lá. O mais legal nisso é que essa característica não atrasa o desenvolvimento da história e nem a deixa confusa. Na verdade, um quebra-cabeça vai sendo montado até que nós, leitores, possamos ver o quadro geral. E mesmo que Paul entregue algumas coisas muito antes de elas ocorrerem, o processo de descobrir como e por que elas vão acontecer é mais envolvente.
Originalmente, À Espera de Um Milagre foi dividido em seis livretos lançados um em cada mês. E essa forma peculiar que o personagem tem de narrar suas memórias foi uma sacada genial de King, pois ela ajuda a refrescar a memória dos próprios leitores sobre os volumes anteriores. Para um livro único, não achei isso tão necessário, mas tendo em mente o formato original em que foi escrito, esse detalhe só comprova o talento do autor.
Para quem começa a ler Stephen King por obras mais voltadas para o terror, é uma surpresa ver que ele possui essa veia dramática. Para ser justo, em todos os livros dele que li até hoje, ele sempre mostrou ter grande compreensão sobre seus personagens para lhes dar a profundidade necessária. Mas nesse em particular a sensibilidade ao descrevê-los é bem maior e o lado emocional e psicológico é melhor explorado. Porém isso é feito sem diminuir o suspense e até mesmo a brutalidade de algumas passagens. Não poderia ser diferente já que vemos o contraste entre a bondade que há no mundo e a crueldade dos seres humanos.
Isso se reflete na personalidade de cada personagem. Paul Edgecombe é um homem atormentado por diversos fantasmas do passado, incluindo as dúvidas sobre as decisões que tomou ao longo da vida. John Coffey é a mistura de uma inocência infantil com um segredo sombrio. Já o ratinho conhecido como Sr. Guizos é a verdadeira personificação do mistério que envolve a todos no Corredor Verde, sejam presos ou guardas.
Com tantos elementos complexos, À Espera de um Milagre não poderia resultar em algo diferente de uma obra comovente que nos faz refletir sobre o valor da vida e o que fazemos dela. Ninguém é totalmente bom o tempo todo, mas podemos fazer o melhor que pudermos em um mundo que já tem maldade demais, mesmo que não sejamos reconhecidos por isso. É o peso dessa mensagem que faz com que esse seja um dos melhores livros que li. De bônus, ainda posso dizer que Stephen King já me fez chorar.
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Artigo sobre o multiverso de Stephen King para o On Literário.