A ideia de um personagem preso eternamente no mesmo dia já é um dos conceitos mais clássicos da atualidade. Desde o filme Feitiço do Tempo, de 1993, onde víamos um dos personagens mais icônicos de Bill Murray sendo obrigado a reviver o dia da marmota. Uma outra gigantesca quantidade de seriados também já trabalharam com tal ideia, como o clássico Arquivo X e o recente Supernatural . Particularmente, no mundo das séries, isso ficou mais marcado. Já é uma instituição o “episódio que o protagonista revive o mesmo dia”. O filme “Antes Que Eu Vá” explora essa mesma ideia numa vertente mais dramática, tentando criar uma reflexão em cima das possibilidades de se viver um mesmo dia várias vezes.
Sam é uma menina popular que possui três melhores amigas, namora o playboy do colégio e parece ter um relacionamento levemente conturbado com sua mãe. Sua vida é bastante mundana e bem nos padrões de uma menina adolescente bonita qualquer. Na noite do dia do Cupido ela vai a uma festa na expectativa de finalmente perder a virgindade com seu namorado, mas uma briga de suas amigas com “a esquisita” do colégio acaba impedindo isso. No caminho de volta para casa, elas sofrem um estranho acidente de carro, fazendo Sam acordar em sua cama novamente no dia do Cupido e sendo obrigada a reviver tudo novamente.
A protagonista é interpretada por Zoey Deutch que recentemente participou do filme “Tinha Que Ser Ele?” (que falamos aqui). Seu trabalho é de longe o que mais chama atenção nesse filme, conseguindo entregar todas as emoções complexas que a trama gera, e ela, mesmo quando o roteiro gera mudanças bruscas de humor, mantém um ótimo nível de atuação. Em compensação, as suas outras três amigas ficam totalmente esquecíveis, exceto por Lindsay (interpretado por Halston Sage). Lindsay é uma personagem importante, mas é escrita de forma rasa e a atuação de Halston não ajuda nem um pouco. A atriz diz quase todas as suas falas de forma sensual, em situações em que isso não é necessário, e, por vezes, deixando cenas sérias meio ridículas.
O primeiro ato é muito eficiente em mostrar os personagens. O filme tem a difícil tarefa de mostrar as meninas como pessoas nem boas, nem ruins, mas sim dúbias. Aliás, este é um ponto fundamental deste filme. Apresentar personagens que são tão comuns que por vezes são pessoas bacanas e odiosas ao mesmo tempo. O roteiro lida com essas questões de forma boa em algumas situações, mas varias vezes dá saltos de humor na protagonista que não fazem muito sentido. O filme supõe que o simples fato de sabermos que a protagonista está vivendo o mesmo dia várias vezes justifica todas as suas reações exacerbadas. O problema é que a montagem não justifica essas transformações, um erro da diretora Ry Russo-Young, que não soube nos mostrar essa mudança ocorrendo na tela. Ela ainda comete dois outros erros pequenos nesse filme: cortes muito mal colocados no terceiro ato e figurantes mal colocados em cena.
O terceiro ato também não é dos melhores. Uma personagem fundamental para a resolução da trama é apresentada de forma muito rasa, sendo que ela seria uma das figuras mais profundas de todo o filme. A obra toda tenta refletir temas densos, e, por vezes, até consegue. Mas de modo geral tudo fica muito superficial, tentando resumir conceitos complexos em algumas frases de efeito.
No fim das contas, Antes Que Eu Vá consegue mostra de forma muito real a vida de adolescentes na época do ensino médio e toca em temas extremamente pertinentes sobre sexualidade e bullying. A obra como um todo até pode trazer reflexões sobre como levar o dia a dia e como lidar com as pessoas a nossa volta. Como narrativa em si, ela falha em vários pequenos aspectos, mas tem coerência interna e apresenta um belo romance que é construído de forma muito interessante. O filme é baseado no livro de mesmo nome, da autora Lauren Oliver, que está sendo publicado aqui no Brasil pela editora Intrínseca.