Basta assistir ao trailer de “O Círculo” para podermos ter uma boa noção das inspirações do filme e por qual caminho a trama vai se encaminhar. Ver distopias nos cinemas é algo que o público jovem já se acostumou a ver. Pregar uma distopia bem disfarçada de utopia é algo diferente para nossa época (aliás, temos um texto sobre Rock e distopias aqui). Usar o conceito mais primário de “1984” não é lá muito criativo, mas misturar esse conceito com um ambiente que não é visualmente decadente forma uma dualidade bacana e desperta a curiosidade necessária para ver o longa.
The Circle é uma empresa que trabalha através do serviço de conectar emails pessoais de seus clientes com suas atividades diárias, compras e outras atividades particulares no geral. Mae (Emma Watson) acaba sendo contratada pela empresa, até então moderna e visionária. Mae se vê muito empolgada por estar perto de pessoas de grande influência. A protagonista percebe que seu papel na empresa na verdade seria outro, uma espécie de protótipo para um novo sistema de observação e quebra da privacidade. O filme tenta se apresentar como algo inovador, mas no geral não apresenta nenhuma crítica jamais vista e não sai da primeira camada em críticas sobre nosso comportamento virtual.
Mae é a única personagem realmente desenvolvida no filme, e o fato de não ter um conflito amoroso como muleta narrativa contribui pra isso. O roteiro do filme não exige uma atuação fora do normal aos seus personagens, mas Emma Watson, por ter uma atenção melhor, se destaca nesse quesito. Já Ty (John Boyega), que é um dos fundadores da empresa, sofre com o mal desenvolvimento de seu personagem, apesar de ser um ator promissor. Mercer (Ellar Coltrane) já tinha se provado ser um ator bem mediano em “Boyhood” e não foi nesse longa que ele pôde se redimir dessa impressão. Tom Hanks, que faz o papel do CEO da empresa, tem uma atuação segura de mais um personagem unidimensional do filme.
A direção e roteiro ficaram por conta de James Ponsoldt, que já tinha mostrado sua dificuldade em criar narrativas que sejam instigantes em seu todo com o fraco “O Maravilhoso Agora”. Em “O Circulo”, ele consegue criar o clima de uma falsa utopia, mas peca na administração do tempo do filme, criando assim uma barriga de estagnação na narrativa. Seu trabalho visual é bem feito, mas o seu roteiro com personagens pouco desenvolvidos prejudica o trabalho de direção e criação de clima com os atores.
Talvez a maior dificuldade pros estúdios seja entender que criar uma obra futurista que alerta para problemas contemporâneos não é mais novidade. Séries como “Black Mirror” já se provaram populares e recentes na memória do público. Usar a premissa básica da gênese desse estilo de história necessita que a narrativa contada seja algo além dos limites da intimidade. No geral, as coisas que funcionam no filme acabam não sendo mérito do próprio filme, e sim um fortalecimento de como suas obras antecessoras eram genuinamente visionárias.