Spoilers: Este artigo contém spoilers da primeira temporada de Pacificador e da segunda temporada de The Boys
A escrotidão humana é capaz de inspirar influenciadores e, pelo visto, não conhece limites. Provas desse fato grotesco podem ser encontradas em eventos recentes que tem como ponto em comum a defesa do nazismo de forma oficial na política. Com um absurdo sem tamanho como esse reverberando aos quatros cantos, o que já era esperado tamanho seu potencial polêmico, e tendo em vista o lado nerd dessa coluna torna-se oportuno relembrar de exemplos recentes em que a cultura pop retratou diferentes facetas de vilões inspirados na ideologia nazista.
Desde o surgimento do nazismo até os dias de hoje a cultura pop tem se posicionado contra todo o horror comandado por Adolf Hitler. É inegável a influência que esse período traumático da história teve na origem dos super-heróis de grandes editoras ou até mesmo em personagens mais desconhecidos do grande público. Por exemplo, em adaptações de quadrinhos para o streamming vimos recentemente vilões que representaram o neonazismo. Mesmo que não tenham ocupado o foco central das tramas em que foram inseridos esses personagens serviram de alerta sobre como os ideais nazistas ainda encontram terreno fértil no mundo atual.
Considerado (e com razão) um dos personagens mais detestáveis da DC Comics, o Dragão Branco foi adaptado na série do Pacificador como pai do protagonista. No começo, Auggie Smith (Robert Patrick) passava apenas a imagem do estereótipo do homem velho e patriótico cheio de comentários racistas. Aos poucos vamos descobrindo que há muito além disso. Em “Best Friends, For Never” (S1E2), temos um primeiro sinal de sua real identidade. É que graças a um erro da equipe do Pacificador Auggie acaba sendo preso. Quando chega na cadeia, ele é venerado por diversos detentos que compartilham de sua ideologia. Próximo do final da temporada, em “Stop Dragon My Heart Around” (S1E7), isso é retomado com mais ênfase quando no combate final entre ambos o Dragão Branco demonstra todo seu ódio contra as pessoas negras com quem seu filho já teve algum relacionamento sexual. Isso, é claro, foi apenas um pedaço da faceta de um vilão que já teve diferentes versões nas HQs da editora. Para saber mais sobre isso, é recomendável a leitura desse artigo do Legião dos Heróis.
Na segunda temporada de The Boys uma das novidades do elenco foi a Tempesta (Aya Cash). Inspirada em um personagem masculino das HQs criadas por Garth Ennis e Darick Robertson, ela serviu como exato contraponto à figura do Capitão Pátria (Antony Starr) por ser uma mulher forte capaz de bater de frente com sua liderança ao invés de simplesmente aceitá-la. Em um primeiro momento, esse detalhe foi predominante ao longo dos episódios e serviu para seduzir o público que desconhecia a nova “heroína”. Foi com o tempo que o discurso de ódio dela contra minorias ganhou espaço. É o que ocorreu em momentos quando ela citou a existência de uma “Guerra Cultural” e um “genocídio do povo branco” em uma conversa com o filho do Capitão Pátria. Apesar de tudo, ela acabou colhendo o mal que plantou na forma de uma surra recebida no último episódio.
Ainda no universo das séries temos o exemplo dos maiores vilões de Doctor Who, os Daleks, que nada mais são do que uma versão da monstruosidade nazista levada ao extremo na ficção cientifica. Criados pelo roteirista Terry Nation na década de 60, essa raça alienígena tem marcado presença desde a primeira regeneração do Doutor (Willian Hartnell) e continua até hoje na Era Moderna da série. Com uma aparência bizarra e robótica essa raça do planeta Skaro sempre representou perigo extremo. Entre suas características que se assemelham com o nazismo destaca-se primeiramente a linguagem deles que é muito direta, o que lembra bem os estereótipos criados com base na figura dos alemães nazistas. Além disso, essas criaturas tem uma clara xenofobia em sua programação já que o principal objetivo delas é exterminar qualquer raça que não é Dalek. Nesse sentido, vale destacar um artigo de Tim Masters para a BBC sobre como Doctor Who reflete o mundo real. Ele relembra os episódios de Genesis of the Daleks da época do 4º Doutor (Tom Baker) em que as referências nazistas nos Daleks ficaram muito mais explícitas. Na trama, vemos o exato momento em que o cientista Davros (o criado dos Daleks) pretende criar uma raça superior com o intuito de exterminar os Thals. Sobre esse arco Tim destaca uma comparação feita pelo Dr. Graham Saunders, do departamento de cinema, teatro e TV da Universidade de Reading sobre os vilões:
Como observa o Dr. Saunders, quando Davros fala sobre supremacia racial em seu covil subterrâneo, é como “Hitler delirando no bunker”.
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Por último, fica só o comentário de que esses exemplos são apenas uma fração de vários retratos recentes feitos na cultura pop a respeito do nazismo. Inclusive, vale ressaltar que existem nas próprias produções citadas outros personagens que, por sua vez, incorporam conceitos autoritários que tem algumas semelhanças com a ideologia nazista como é o caso do fascismo. No entanto, falar sobre eles é assunto para outro momento. Enfim, ressalvas à parte, espera-se que cada vez mais toda e qualquer manifestação escrota a favor da ideologia nazista seja ferozmente combatida. Infelizmente, não há como viajar no tempo e impedir o que aconteceu, mas pelo menos podemos enfatizar a gravidade do erro para que não se repita novamente.
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Marcus é redator no site Leituraverso e um dos hosts do podcast Leituracast