A Panini vem lançando uma coleção espetacular onde vemos grandes personagens da DC nas mãos dos grandes desenhistas que já passaram pela editora. Gastei um bom tempo falando só sobre os três volumes da Mulher Maravilha desta coleção, é só clicar aqui e ler. Nesta edição temos um volume único que compila a saga Lendas, a primeira grande saga da DC após a reformulação do universo. Os desenhos ficam por conta do John Byrne e ele encabeça toda a edição já que esse projeto tem foco nos desenhistas, não é a toa que seu nome está na capa.
O grande problema desse tipo de “mega saga” é que geralmente elas partem muito mais de uma necessidade de vender muitas revistas, e fazer mudanças editorias, do que contar uma boa história. Isso acontece um pouco com Lendas, mas ainda assim existe uma boa história a ser contada, o problema é que essa boa história está recheada de enxertos editorias que não fazem muito sentido. O que eu quero dizer com isso? Personagens que aparecem só por que são famosos, mistura com outras revistas que só quebram o ritmo e uma certa enrolação. Mas ainda assim essa é uma boa história.
O mais interessante de Lendas e que ela foi publicada no mesmo ano de Watchmen, trabalha com uma temática bastante semelhante, mas segue por uma ideologia completamente diferente. O plot de Lendas é que Darkseid quer conquistar a Terra definitivamente, mas para isso ele precisa destruir os heróis. Ele cria um plano que consiste em fazer a população começar uma caçada aos heróis até que eles sejam proibidos pelo o governo. Mas o que difere ela de Watchmen? Lendas é uma história otimista. A ideia era recriar a sensação que os heróis da DC eram deuses, algo que havia sido abalado com a destruição do universo em Crise das Infinitas Terras.
Esse é um dos pontos fortes dessa história. Ela realmente se preocupa em trabalhar a figura dos heróis e o conceito por trás dessa ideia. Além disso, vemos o surgimento da Liga da Justiça, e do Esquadrão Suicida , e a introdução do Capitão Marvel (atualmente chamado de Shazam) ao universo DC. Isso pode parecer um tanto óbvio hoje, mas naquela época foi um verdadeiro evento, pois Capitão Marvel era um concorrente direto de vendas com o Superman. Ocorreram até processos para impedir a publicação do Capitão alegando que era uma cópia do último filho de Krypton. No final das contas a DC comprou o personagem e trouxe para seu panteão de heróis. É muito bom ver os heróis mais icônicos da editora todos juntos, e ainda se conhecendo. É muito interessante ver esse universo se formando e justamente o universo que protagonizou as maiores histórias da DC dali em diante.
Mas quais são os pontos ruins dessa edição? O roteiro de John Ostrander e Len Wein não é muito afiado e constantemente temos recapitulação de coisas que já aconteceram nas edições anteriores, algo que poderia ser útil quando se lia essa história mensalmente, mas ler tudo de uma vez num encadernado torna tudo repetitivo demais. Por vezes a história também é muito simplista e com coincidências excessivas. Algo que resume isso é a participação do Batman, que claramente só está nessa história por que ele é um personagem importante.
Não é a toa que o nome de John Byrne está na capa da edição, pois ele é a grande estrala dessa saga. Seus desenhos, e narrativa visual, fazem a história parecer muito mais épica, e interessante, do que ela realmente é. Curiosamente a única história que Byrne escreve (uma edição da mensal do Superman que ele dominava na época) é a melhor edição dentro deste compilado. Alias uma edição que acaba deixando uma contradição gritante com a saga principal. Outra contradição, mas dessa vez no desenho, é o uniforme do Batman que muda de cor de uma edição para outra sem muito motivo.
De qualquer forma a história tem seus bons momentos e flerta com a inocência e o cinismo de um jeito muito curioso. Um dos vilões, doutor G. Gordon, é um paralelo interessantíssimo com a histórica figura do doutor Frederic Wertham que escreveu o livro “Sedução dos Inocentes”, responsável por colocar os quadrinhos de super-heróis numa longa era de censura. Já nos anos 80 ele era só um nome antigo do passado e toda a censura nesta mídia já havia acabado. Hoje o personagem de Gordon pode fazer um paralelo com figuras políticas que vemos hoje, que fazem discursos de ódio e incitam a violência. Lendas caba sendo atual de um jeito não intencional e relembra que esse universo de heróis as vezes precisa de um pouco de leveza divertida.