Sempre tive a impressão que a história do Brasil era um campo muito fértil, porém não explorado. Nos Estados Unidos temos uma grande exploração da História como fonte de filmes e ambientes interessantes para se criar mais histórias. Temos o velho oeste, guerra, início do século XX e diversos outros períodos. Sempre achei que o Brasil possuía potencial semelhante com nossa colonização, Brasil Império, Ditadura e infinitos outros momentos. Temos poucos exemplos da nossa História nas telas, mas Joaquim chega para mudar isso.
O filme narra parte da vida de José da Silva Xavier (Tiradentes) e como ele abraçou as ideias da inconfidência mineira. Uma espécie de filme de um “herói” em formação. O filme mistura fatos totalmente fictícios e outros reais para contar como a psique e ideologia desse personagem histórico começam a se formar. Antes de continuar a crítica devo informar que sou estudante de história e, por isso, é impossível não analisar esse filme por parte desse prisma. Vou tentar fazer uma análise do filme pelo filme, apesar de informações históricas fazerem uma grande diferença na compreensão.
No início temos Joaquim (interpretado brilhantemente por Júlio Machado) que simplesmente deseja ascender socialmente, ficar com a mulher que gosta e beber uma cachaça de vez em quando. O primeiro ato apresenta muito bem aquele pequeno universo onde ele estava inserido. A fotografia, as locações e tudo que gera o visual do filme são incríveis. É um daqueles filmes que te faz acreditar que ocorreu uma viagem no tempo para obter aquelas cenas. Isso proporciona um mergulho muito rápido na história. Outra coisa que ajuda é a interpretação como um todo. Tirando um ator ou outro, a grande maioria está incrível. Aplausos para Isábel Zuaa que fez um trabalho sensacional com uma personagem ainda mais sensacional.
O segundo ato é o mais interessante é onde o filme mais acerta. Joaquim e um pequeno grupo vão à busca de ouro, iniciando assim uma espécie de aventura. Esse segundo ato foi o que sempre sonhei num filme sobre a história do Brasil. Um grupo formado por um escravo, um português, um brasileiro livre e um índio que acidentalmente faz um enorme paralelo à história do país. Ao longo da viagem vemos eles se relacionarem, brigarem, falarem sobre suas vidas e diferenças. Por mim o filme nem precisaria ser sobre Joaquim. Bastava mostrar um grupo de homens comuns diante de uma missão difícil.
O terceiro ato é o pior, pois, além de ser um tanto abrupto, mostra de forma muito superficial o início do esclarecimento político de Joaquim. A última cena é extremamente abrupta e beira ao incompleto. O filme como um todo tem um estilo muito cru, principalmente na forma como foi filmado. A câmera balança bastante, passeia de forma trêmula entre as cenas, e dá closes fortes. Muito bom para a proposta. Mas as locações e as situações eram tão bonitas que senti certa pena de não vê-las com mais calma e com menos câmera tremendo. Um exemplo: uma cena simples onde Joaquim está cavalgando num cavalo branco em campo aberto. Com uma câmera mais estática, e uma trilha sonora. Teria sido uma cena incrível.
De modo geral o filme é bastante lento, mas isso faz total sentido com a proposta. É um filme realista que se passa no Brasil colônia, obviamente ele será mais moroso, assim como um filme de velho oeste clássico. Em sua proposta de apresentar um personagem histórico ele fica um tanto incompleto, mas com uma continuação poderia gerar uma grande história. Uma continuação se faz muito necessária, já que a história de Joaquim como inconfidente nem ao menos começa direito.
Agora um pouco do lado historiador. Nesse sentido gostei bastante, pois o roteirista se baseou nos estudos mais recentes sobre Tiradentes que o colocam como o elemento mais humilde da Inconfidência Mineira e mergulha nas camadas sociais do Brasil colônia. Por outro lado quando o filme mergulha em “contar a História real” acaba ficando levemente artificial. Mesmo com a atuação incrível de Júlio Machado, alguns textos são tão artificiais que te fazem sair da história (mas para ser justo isso acontece muito pouco). Talvez se o filme não se prendesse a fatos históricos e simplesmente contasse uma história num momento histórico, teria mais sucesso.
Seria uma dádiva termos mais filmes como esse, algo que lhe faça mergulhar profundamente numa época. Um filme que soe tão real que faça você pensar “Deve ter sido exatamente assim que aconteceu”. A direção e roteiro de Marcelo Gomes são incríveis. Este é seu nono trabalho em direção, mas já escreveu alguns outros roteiros. Um nome com muito potencial para ir cada vez mais longe. Só acho que para um público que conheça muito pouco desse momento, ou sobre Tiradentes, possa ficar meio perdido no terceiro ato.