Por Vanessa Barros
O negócio foi fechado semanas depois. Levou tempo para que a timidez de Danilo fosse vencida. Estava realmente interessado em Yolanda. Chamaria a cliente para sair? Chamaria! Se ela não aceitasse, paciência. Mas ele tentaria. E a princípio, o pedido foi negado mesmo. Yolanda achou meio estranho. Mas negou com elegância, cuidadosamente. A relação por muito tempo manteve-se exclusivamente profissional. Mas era oportunidade para que observassem um ao outro.
Numa tarde, só em casa, já que os filhos haviam saído com o pai, Yolanda resolve dar uma chance a Danilo… E a si mesma. Por telefone:
_ Oi, Danilo. Tudo bem? Chuvinha boa, não? Olha, estava pensando… Aquele pedido ainda está de pé? Eu gostaria de muito sair, ir a um café talvez, conversar um pouco. Você ainda quer?
Assim iniciou-se o relacionamento até onde se sabe muito feliz e duradouro entre um homem pequeno, sem nada de especial, segundo opinião da ex dele, e de uma mulher sem graça e que não conversava direito, que jamais serviria de companhia para um grande homem, segundo sentia o ex dela. Os rótulos passaram a ser, inclusive, motivo de riso para os dois. Certa vez, em papo alegre em casa, já depois de casados, Yolanda brincara:
_ Aí, está vendo? Todo mundo tem seu pé de chinelo. Ainda bem que você é pequeno e insignificante. Eu não sou mulher à altura de um grande homem. Se fosse um grande homem eu não estaria com você _ disse às gargalhadas.
_ Esta é mais universal das verdades!_ respondeu Danilo fingindo seriedade.
O que os relacionamentos anteriores mais ensinaram aos dois é o quanto devem ser observadas as pessoas que rotulam outras como inferiores. Há que se observar bastante. O que se descobre quase sempre é a confirmação de que acusam os outros daquilo que são. Sorte terem tido Danilo e Yolanda oportunidade de não estarem mais com os antigos parceiros. Muito embora os tivessem amado muito sinceramente. Os diferentes se repelem. Os semelhantes se atraem.
Algum tempo depois do casamento, abriram um pequeno negócio no qual Yolanda venderia seus bolos e doces. Além de doceira de mão cheia, a mulher foi-se revelando uma excelente administradora. O marido ainda continuaria no emprego. Depois porém, se uniria à empresa junto à mulher, caso o empreendimento exigisse. Os filhos dela, além de estudar, trabalhariam firme com a mãe e o padrasto com quem se relacionavam muito bem. Dentre dezenas de fregueses assíduos e fiéis da confeitaria, estariam os pais de Marcelo que apoiavam e torciam pelo sucesso da ex-nora. Eram, sempre haviam sido, justos para com ela. Sentiam-se felizes pela segurança do futuro do netos. A pequena confeitaria evoluiria a passos largos.
Danilo nunca mais teve notícias de Marina. Casado com Yolanda as coisas iam tão bem, inclusive materialmente, que dentro de algum tempo, se continuassem no ritmo que iriam, ele próprio poderia estar em nível material bem semelhante ao daqueles homens a quem a ex-mulher tanto admirara. E era bom não estar mais com ela. Esperava ele que Marina estivesse feliz ao lado de algum. Mas que se mantivesse longe. Yolanda, por sua vez, tendo com Marcelo dois filhos, não tinha como se distanciar definitivamente. Aprendera a desejar a felicidade do ex também. Tinha profunda gratidão pela “grande” mulher por quem ele se apaixonara na faculdade. Ninguém sabe ao certo ao que podem levar certas decisões na vida. Toda escolha tem lá sua caixinha-surpresa. Da nova companheira de Marcelo, Yolanda esperava só uma coisa: que fosse uma madrasta no mínimo razoável. Com o ex-marido fizesse o que quisesse. Mas com os filhos? Ah, com os filhos… Ai dela… Ai dela… E embora ainda tivesse reduzidíssimo convívio com Marcelo, por causa dos meninos, Yolanda evitava saber qualquer coisa que fosse sobre atual vida dele. Quanto à vida dela, era exposto a todos o quanto estava bem. Amorosa e materialmente falando. Passado quase totalmente superado. Custava-lhe um pouco ainda perdoar-se por ter escolhido Marcelo para pai dos filhos. Mas o perdão viria com o tempo. E tinha ela certeza, a culpa seria superada como todos os outros sentimentos que só serviriam para adoecer e enfraquecer a quem os sente. Jamais a quem eram atribuídos.
Como havia sido bom a ela não ser uma “mulher de verdade”. Que bom haver homens pequenos e insignificantes tais como seu segundo marido perdidos por aí… Ambos pessoas pequenas e sem nada de especial. Yolanda e Danilo eram, sem dúvida, um casal que se merece.
Vanessa Barros (MG) é escritora. Autora dos livros Crônicas a Bordo de um Trem Urbano e Crônicas a Bordo de um Trem Urbano – A viagem continua. Para conhecer mais sobre o seu trabalho ouça nossa entrevista com ela no Leituracast 11.