Um assassinato. Uma tempestade. Uma vida. Com estes três elementos Durante a Tormenta, filme disponível na Netflix dirigido por Oriol Paulo (Os Olhos de Júlia), consegue construir uma trama de “viagem no tempo” bem engendrada e bastante cativante, trazendo uma narrativa interpolada entre dois momentos separados por 25 anos, de certa forma lembrando a premissa de A Casa do Lago e Efeito Borboleta.

Uma inusitada interferência entre duas épocas diferentes faz com que Vera (Adriana Ugarte), uma mulher casada e feliz, salve a vida de um menino que morou em sua casa há 25 anos. O ato de bondade distorce a realidade e Vera acorda em uma realidade totalmente diferente, onde sua filha nunca nasceu e ela nunca conheceu seu marido.

É inegável como filmes que abordam “viagens no tempo” instigam a curiosidade. É uma fantasia que habita na cabeça de todos nós: “o que faríamos se pudéssemos viajar no tempo ou de algum modo conseguirmos interferir no passado de nossas vidas?”. Porém a partir deste questionamento vem a problemática do paradoxo da viagem no tempo e suas diversas teorias. E cada filme acaba trazendo uma teoria para que possa seguir numa coerência de roteiro e em Durante a Tormenta, apesar de não termos uma viagem no tempo propriamente dita, podemos ver os impactos de uma interferência em um fato no passado, e como que a partir dali tudo pode se modificar. E estamos sentimentalmente envolvidos com a mudança, pois envolve vidas de duas crianças, a de Nico no passado e a da filha de Vera no presente.

Oriol Paulo dirige com qualidade o filme, em especial as montagens entre os dois pontos distintos no tempo, além de conseguir algumas vezes imputar um clima de suspense bem interessante (destaque para as cenas de Nico dentro da casa de seu vizinho assassino Ángel). O roteiro (também escrito por Paulo) consegue esconder bem o plot twist iminente e os três dias de tempestade, que abriu a anomalia temporal, contribuiu imensamente para isso. Porém na direção de atores acho que deixou a desejar ou talvez o máximo a se tirar do elenco era isso mesmo, pouco. Mas Adriana Ugarte já havia entregado mais em Julieta sendo dirigida por Almodóvar.

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Um ponto questionável dentro da trama é a fixação de Vera Roy em querer voltar para a realidade anterior dela, já que a nova era profissional e passionalmente melhor. Ok, não estou aqui para julgar o peso do amor de uma mãe para uma filha, mas o filme acaba sugerindo que sem a experiência da maternidade a vida da mulher é incompleta. Prefere uma vida frustrada profissionalmente mas com filho, do que uma ao contrário. Há de se considerar o peso do vínculo já criado com o filho, é lógico, mas creio que isso não ficou bem esclarecido visto que o peso profissional para ela a afetava bastante também. E esse problema nos leva para um outro ponto que questiono: A  coerência na viagem no tempo.

[Nesse parágrafo tem um leve spoiler] Usa-se o clichê da Vera ser a única pessoa que mantém a memória intacta com as mudanças de status quo, ok, podemos relevar e imaginar que deva ser por ela ser o elemento que alterou a linha do tempo. Mas e o Inspetor Leyra? A linha do tempo pra ele simplesmente apaga depois de alterar o tempo ao fim do filme? Ele desaparece após influenciar o passado? Ou são criadas linhas de tempo diferentes que o filme sonegou? [fim do spoiler] 

De toda maneira é impressionante como o cinema espanhol cresceu na última década saindo apenas dos bons filmes de terror e enveredando em um excelente nível para ficções “quase” científicas. Estou curioso para ver os próximos trabalhos de Oriol Paulo e espero que sejam boas experiências assim como em Durante a Tormenta, um excelente filme que você pode acompanhar agora mesmo no catálogo da Netflix.

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Daniel Gustavo

O destino é inexorável.

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