Breaking Bad configura em uma lista extremamente seleta de séries que são consideradas perfeitas tanto pelo público quanto pela crítica. Justamente por isso que muitas pessoas torceram o nariz quando um filme foi anunciado, mesmo que ele fosse dirigido e escrito pelo criador da série. Os próprios atores ficaram relutantes, pois não viam necessidade de mexer no que estava perfeito. Mas logo o longa ficou disponível na Netflix, a mesma que de certa forma foi responsável pela popularização da série.

O filme conta os acontecimentos que se dão logo após o fim do último episodio, mostrando o que se deu na vida de Jesse Pinkman, após ser escravizado para continuar produzindo drogas. Vemos não só a sua jornada para abandonar seu passado quanto temos vislumbres do que se passou com ele enquanto estava privado de sua liberdade.

Boa parte da crítica está dizendo que esse não é um filme. Alguns chamam de um episódio longo e outros como uma ausência de história feita para capitalizar em cima do sucesso da série. Ambas as afirmações são bastante questionáveis. De fato o roteiro apresentado por Vince Gilligan se baseia inteiramente no conhecimento prévio dos acontecimentos da série, mas nem por isso ele deixa de ser um filme. Temos arco de personagem e uma temática que se completa ao longo do filme.

Poderíamos considerar o personagem de Jesse como um dos que tiveram o final mais raso, mesmo que tenha ocorrido um fechamento de arco no último episódio. Em dado momento ele se torna um co-protagonista da série, sendo um personagem que servia como âncora moral para os telespectadores enquanto Walt se afundava cada vez mais em sua obsessão. Isso justifica um filme para dar um fechamento à altura do personagem que não fosse “sai em disparada em seu carro rumo ao por do sol”.

A atuação de Aaron Paul se mantém incrível como já conhecíamos, além da direção de Gilligan que continua tão inventiva quanto antes. Breaking Bad sempre teve uma linguagem cinematográfica para uma série de TV, então era de se esperar que o filme mantivesse o padrão nesse sentido. Planos visto de cima, objetivas, planos detalhes e diversas técnicas que amplificam a imersão de uma história que já é interessante. No que diz respeito a roteiro temos um suspense com pitadas de drama onde a ideia central é te deixar na ponta da cadeira e torcendo para que o protagonista consiga escapar dos perigos e conseguir a tão sonhada liberdade. As situações são verdadeiramente preocupantes e o risco é sempre real e palpável.

Mas apesar de manter sua atenção presa esse não é um roteiro perfeito. Dois personagens, que funcionam como espécies de antagonistas, possuem personalidades e comportamentos um tanto irreais e caricaturais para um tom tão realista. A série também tinha esses momentos como os irmãos gêmeos assassinos que se comportam como robôs. Aqui temos duas pessoas malignas que se comportam como vilões de histórias em quadrinhos de tão exagerados que são seus atos.

Mas a competência da escrita de Gilligan consegue desviar sua atenção disso e acreditar ao longo da história de que tais eventos são reais e plausíveis. Os diálogos também são interessantes, apesar de fazerem um uso excessivo do silêncio, deixando o filme um tanto lento. O decorrer da história é simples, mas instigante e impossível de não se importar com o que se passa na tela caso houvesse algum carinho prévio por Jesse.

A parte dramática é impactante. O personagem passou por um dos horrores mais destrutivos que um ser humano pode passar: ser escravizado. O filme não tem medo de criar um momento tenebroso em cima disso, mas se foca mais na fuga e busca pela liberdade do que no terror do aprisionamento. Mesmo assim temos as consequências da escravidão impressas no personagem e vemos que ele passou por uma transformação completa.

No fim esse é um filme digno do legado de Breaking Bad e encerra perfeitamente o personagem de Jesse. Algo que todo fã da série merecia ver, tanto quanto o personagem merecia viver.

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Raul Martins

Autor dos livros Cabeça do Embaixador e Onde os sonhos se realizam

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