Quero deixar claro que esse texto já pretendeu, mas não é apenas uma crítica clássica de Vingadores: Ultimato. Nada que é comum se enquadra a esse filme que encerra uma saga de outros 21. 

[alert type=red ]Ele está cheio de SPOILERS então, se você ainda não assistiu ao último filme dos Vingadores, NÃO LEIA![/alert]


Confesso que me foi incumbida uma missão gigante. Outro dia no Grupo do Tarja Nerd lá no WhatsApp perguntamos quem iria ver Vingadores: Ultimato primeiro, e, quando eu disse que eu veria o filme, ficou comigo a responsabilidade de escrever uma crítica que fosse a altura de todo um projeto da Disney e da Marvel que culminou no grande filme que vi no cinema. Já adianto ao caro leitor que eu falharei nessa missão. Veja bem, falharei não porque não sei escrever, ou porque a crítica será muito ruim, mas sim porque estamos diante de um trabalho de onze anos que cativou bilhões de pessoas. Um projeto que mudou a forma como vemos os super-heróis, as narrativas fantásticas e até mesmo o cinema de uma forma geral.

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Ainda que nem todos os filmes que a Marvel lançou nessa longa caminhada tenham sido obras primas da sétima arte, a maior parte deles de fato foram blockbusters muitas vezes discutíveis. Esse grande projeto de duas partes; Vingadores: Guerra Infinita e Ultimato, só foi possível porque existiu um projeto enorme da produtora, que envolveu grandes artistas e produtores, além de um incontável número de trabalhadores da indústria do cinema que se colocaram como parte desse, que pra mim é o maior projeto da história da indústria cinematográfica até o momento.

E se estamos nessa esteira de falar de Vingadores como o ápice do projeto cinematográfico da Marvel, o famoso MCU, ele também carrega consigo outro ápice. É nesse filme, nesse momento glorioso da arte que temos o grande enaltecimento da narrativa do herói, mas não de qualquer tipo de herói, mas sim do mais importante tipo de herói que temos nas nossas narrativas do século XX e XXI. O super-herói de quadrinhos. A narrativa do herói dos Estados Unidos, o típico herói que carrega consigo todos os valores da pátria americana, essa narrativa chegou ao seu momento épico.

Mas antes de falarmos dessa narrativa falemos do filme em si. Vingadores: Ultimato é o quarto filme da franquia Vingadores do cinema. O terceiro filme dirigido pelos irmãos Anthony e Joseph Russo. Nesse filme, após os acontecimentos de Vingadores: Guerra Infinita, temos a visão dos heróis que sobreviveram e que se mantiveram lutando após a destruição de metade do universo feita pelo poderoso vilão Thanos.

O primeiro ponto de choque do filme acontece quando descobrimos que Thanos depois de usar o poder das Joias do Infinito para destruir metade das criaturas vivas do universo, usou o que restava de seu poder para destruir essas mesmas joias. Assim, no presente, não há mais como reverter o que foi feito pelo Titã, é aí que os Vingadores têm à frente uma das missões mais interessantes de todos os filmes da Marvel. Voltar ao passado e trazer as joias para o seu presente, no intuito de desfazer a destruição que havia sido concretizada no primeiro filme.

E é nesse ponto que as coisas ficam interessantes. Ao viajar por diversos momentos dos filmes da produtora, o filme passeia pela própria história, pelas suas próprias narrativas e faz um fã service muito bem estruturado. Esse é um filme de celebração. Celebra-se aquilo que foi feito durante onze anos. Ao longo do filme nos vemos na batalha de Nova York, em Asgard, nos planetas explorados pelos guardiões da galáxia, nas instalações da SHIELD. Vemos personagens mais jovens, personagens que já se foram, personagens que estão retornando e saudamos essa narrativa imensa que olha para dentro de si mesma e se entende enquanto história e interage com ela mesma.

Isso é o grande momento do filme. Pois, se nós fãs ficamos durante um ano conjecturando como o novo filme faria para ser maior, em termos de grandiosidade, que o Vingadores: Guerra Infinita. Os roteiristas e diretores entenderam que a única forma de o fazer maior que seu antecessor era mais do que colocar os personagens juntos em cena, colocar essas histórias dentro de um contexto ainda maior para torná-las ainda mais épicas.

Outro aspecto importante fica na construção dos personagens. Podendo essa ser dividida em duas partes. A primeira parte é a influência dos acontecimentos do primeiro filme na vida e na relação destes, vemos um típico momento pós-traumático onde cada um dos personagens reagiu de uma forma diferente aos acontecimentos do primeiro filme. Temos um Bruce Banner que aprendeu a controlar o corpo do Hulk, e se no outro filme não tivemos quase nada de Hulk, nesse tivemos apenas O Gigante Esmeralda, sem se transformar em Bruce Banner. Temos também o Capitão América tentando ajudar as pessoas que sobreviveram, temos um Thor que se entregou às bebidas e jogos de vídeo game, deixando a barriga crescer. E o mais importante, temos um Tony Stark casado, vivendo sua vida tranquila, com uma filha.

A segunda parte é a relação desses personagens com o passado. Ao entrar em situações e momentos de seus passados, esses personagens se transformam e interagem com seus próprios problemas e medos de forma completamente diferente. O grande exemplo disso é o Thor, que ao encontrar com sua mãe em Asgard conta para ela suas experiências e muda a forma como ele próprio encara o fracasso de Guerra Infinita. Além disso temos interações muito bonitas e muito interessantes entre personagens que até então não se relacionavam, e isso só é possível graças ao leque gigantesco de personagens que foram colocados à disposição dos irmãos Russo para a produção do filme. Se podemos ver interações muito interessantes entre passado e futuro, como o encontro entre Tony e Howard Stark e o debate entre ciência e magia proposto por Hulk e a Anciã, é graças ao poder desse universo gigantesco de personagens criados pelo MCU.

Agora volto à questão da narrativa épica. Para isso é necessário falar do arco de dois personagens centrais da trama, o Capitão América e o Homem de Ferro. É importante entender que esse é um filme de conclusão da história desses dois personagens. Vingadores: Ultimato termina de contar a história de Tony Stark e de Steve Rogers e ao fazer isso coloca os dois como os grandes pilares desse projeto do MCU, e mais do que isso, coloca-os como os grandes exemplos do arquétipo máximo do super-herói clássico das narrativas que começaram lá na década de 1920 e se tornaram ainda mais fortes no decorrer do século XX. Comecemos pelo capitão.

Steve Rogers é, desde o primeiro filme em que ele foi apresentado, o grande representante dos valores americanos. Todos os valores do sonho americano, da realização de uma sociedade que se desenvolve e se torna a nação líder do planeta no século XX, valores bons ou ruins, são representados na figura do Capitão América. Parece repetitivo e meio clichê colocar isso em perspectiva, mas quando entendemos que ao longo desses onze anos o capitão foi colocado em situações e momentos repletos do dilema moral que a sociedade americana julga relevante, entende-se que, ainda que com uma nova roupagem, bem diferente daquela que o construiu nas décadas de 1930 e 1940, a moralidade e os valores dos EUA ainda são a essência do Capitão América.

Dentro disso o filme fecha o arco do Capitão de forma perfeita. Fazendo com que ele use tudo que ele construiu ao longo de seus filmes, trazendo-o muito mais para uma perspectiva de herói focado no seu objetivo, que condiz com seus preceitos morais. Uma cena exemplar disso é que para conseguir o cetro de Loki, que continha uma das joias do infinito, ele se disfarça de agente da Hydra para convencer os outros agentes a entregarem o cetro para ele. Com toda a formação do personagem e seus preceitos de moralidade fixos e destacados, o Capitão representa uma visão interessantíssima dos EUA. Steve Rogers representa a América da diversidade, é um líder que representa uma ideia muito mais progressista do país. Liderando os Vingadores ele mostra que somente com o apoio de vários diferentes grupos, homens, mulheres, negros, brancos, ricos, pobres, jovens, alienígenas etc. é que seria possível vencer as adversidades. O Capitão América é o líder da diversidade, bem aquilo que os setores mais progressistas dos Estados Unidos entendem como os valores americanos.

A representação máxima desses valores americanos está colocada no final dado à Steve. Incumbido da missão de levar as joias do infinito aos seus respectivos lugares no passado e voltar ao tempo presente, Rogers desvia-se do caminho e volta para Nova York, onde temos uma cena nos anos 1950 em que ele está com Peggy Carter dançando um jazz americano suave em uma casa no subúrbio, onde passam carros de classe média. Esse final demonstra bem os valores norte-americanos representados pelo Capitão. Steve é o homem que vive uma aventura gigantesca, que envolve explosões de raios gama, ficar congelado durante 70 anos, lutar contra e com seres alienígenas, conhecer outros planetas, outras galáxias, outras culturas, experimenta o novo e o velho, e ainda assim, no final de tudo isso, a grande realização do Capitão América é viver o sonho americano, ter uma casa, uma família, e a mulher que ele ama ao seu lado.

O outro personagem tem pontos semelhantes e pontos de diferença. Tony Stark deixou de ser o gênio, bilionário, playboy filantropo que era nos seus primeiros filmes e se tornou um herói. A grande diferença de Tony para Steve é que o Homem de Ferro não tinha esses valores intrínsecos a ele. Mas com o heroísmo imposto a ele pelo seu poder, ele se tornou um herói. Assim temos uma jornada do herói mais clássica colocada para Tony Stark e seu desfecho não poderia ser diferente. Ao tentar provar para todos que ele era um homem preocupado com a proteção da humanidade, o seu sacrifício final e derradeiro para restaurar a ordem e salvar as pessoas do mau que é Thanos, é o último estágio de uma jornada de construção de heroísmo muito bem-feita.

Tony Stark é o verdadeiro herói humano, que tem dificuldades, que comete erros, que falha e concerta suas falhas. Mas que mesmo com todos os problemas que um homem carrega, ao ver uma injustiça ser cometida, ao se deparar com o momento derradeiro de se provar herói, ele não pensa duas vezes e se submete ao fim inabalável. Tony Stark abdica da sua família, da sua filha e da sua própria vida por um ideal de justiça, essa é a narrativa do herói colocada em termos máximos. O Homem de Ferro se torna, com a conclusão de sua história, o maior herói da história do cinema, quiçá a maior narrativa de herói de todos os tempos, o ápice do Super-herói.

Assim, Vingadores: Ultimato se coloca como o desfecho de um projeto que começou a onze anos atrás. Uma narrativa que contou com 22 filmes e uma gama de diretores, roteiristas, designers, atores, produtores e tantos outros que fizeram parte do MCU. Esse desfecho é como foi toda essa fase da Marvel nos cinemas. Tem falhas, imperfeita, porém muito divertida, muito bem trabalhada, respeitando as pessoas que acompanharam toda essa construção, heroica, épica e acima de tudo humana. E é disso que se trata, Vingadores representa tudo aquilo que nós do século XXI acreditamos e apreciamos. O filme cria ganchos para o futuro da Marvel nos cinemas, e transforma todo um universo que passará por mudanças. O que esperar do futuro? Ninguém sabe, mas será que essa é a hora de pensarmos no futuro? Para esse que vos escreve, não é o momento. Vingadores: Ultimato é também uma celebração, então é muito importante para nós nesse momento celebrarmos o que foi feito nesses onze anos e é muito importante agradecermos pela sorte que temos de viver em uma época em que podemos ver todos esses filmes no cinema. E principalmente podermos ver o grande ápice dessa narrativa que encantou gerações e que nos deu as mais impressionantes e fantasiosas histórias. Obrigado Stan Lee! Obrigado Marvel! E viva os super-heróis!

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