Existe uma razão pela qual Stephen King é conhecido como o mestre do terror. Além da imaginação aparentemente sem limites, King tem a rara habilidade de entrar no psicológico de seus personagens e de seus leitores e dali extrair várias emoções. Uma de suas obras que melhor exemplifica isso é Misery: Louca Obsessão, que nos mostra como a mente humana pode ser imprevisível e assustadora.

Paul Sheldon é um escritor que conquistou a fama graças à série de livros protagonizados por Misery Chastain. Após sofrer um acidente de carro durante uma nevasca, ele é resgatado por Annie Wilkes, uma enfermeira aposentada que é obcecada pelas histórias sobre Misery. Insatisfeita com o final do último livro, Annie mantém Paul trancado em um quarto e o obriga a escrever outra narrativa com um desfecho que seja do agrado dela. Ferido e incapacitado, ele descobre que não tem alternativa senão fazer o que a mulher está pedindo; do contrário, sofrerá dor e agonia extremas.

Considerando apenas a trama, Misery: Louca Obsessão já é uma obra envolvente. Porém, saber como ela foi concebida e qual significado tem para Stephen King, a torna ainda mais atraente. Após sonhar com a premissa do livro enquanto dormia em um avião, King começou a escrevê-lo durante o período em que mais sofria com o vício em álcool e drogas. Em sua autobiografia Sobre A Escrita, ele declara que Annie Wilkes é a personificação da cocaína e da bebida e que estava cansado de ser refém dela. Ao mesmo tempo, é curioso perceber que esse fardo também impulsionava sua criatividade de maneira significativa, assim como Annie faz com Paul Sheldon no romance.

Graças a essas semelhanças entre a ficção e a vida pessoal do autor, é possível perceber a metalinguagem presente em Misery, pois esta é uma narrativa sobre o poder da escrita, tanto para o personagem quanto para seu criador. A única coisa que mantém Paul vivo é contar sua história tal qual Sherazade fez em As Mil Uma Noites. Da mesma forma, o que sustentou Stephen King durante seus anos de vício foi sua capacidade de se expressar através de seus escritos.

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Com tantos significados implícitos, é inevitável que o lado psicológico seja a maior força presente na obra. O terror transmitido pelas páginas não vem de um monstro sobrenatural ou vindo de outro planeta, e sim de uma pessoa mentalmente desequilibrada, porém verossímil. Annie Wilkes é uma das personagens mais complexas e perturbadoras da ficção graças à sua instabilidade. Nunca sabemos quando ela irá explodir ou fazer algo cruel, mas a expectativa para esse momento é o que causa a verdadeira angústia (significado da palavra misery). Não é à toa que Kathy Bates ganhou o Oscar de melhor atriz ao interpretar Annie na adaptação para o cinema de 1990.

Alguns dos desfechos criados por King dividem a opinião dos leitores devido à qualidade, mas no caso de Louca Obsessão é totalmente satisfatório e coerente. Só sabemos o que realmente aconteceu e quais foram as consequências lá nas últimas páginas e, até chegar nesse momento, ficamos apreensivos com o que irá aparecer pela frente.

Misery: Louca Obsessão vai muito além da ficção ao se revelar um grito de socorro do próprio autor que se agarra à vida somente pelo amor aos livros e à escrita. E mesmo que esse simbolismo não seja de conhecimento do leitor, a experiência de se aventurar por esse romance mostra a verdadeira habilidade de Stephen King para criar uma tensão psicológica aterrorizante.

Adicione este livro à sua estante!

Leia a resenha de Sobre a Escrita: A Arte em Memórias

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Mozer Dias

Engenheiro por formação, mas apaixonado pelo mundo da literatura e do cinema. Se eu demorar a responder, provavelmente estou ocupado lendo ou assistindo a um filme.

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