Van Gogh é considerado o pai da arte moderna e possui uma das histórias mais dramáticas e poéticas do mundo da pintura. Morreu sem nenhum renome, só conseguiu vender um de seus quadros ao longo da vida e partiu deste mundo sem a mínima noção do impacto que seu trabalho teria. Justamente por ser essa figura trágica ele se tornou um nome tão poderoso quanto seus quadros e desperta o fascínio de diversas pessoas ao longo das décadas. Tentando desvendar seus últimos dias o filme Com Amor, Van Gogh faz uma recapitulação dos eventos até o dia da sua morte através de uma ficção.

Um homem chega à cidade natal de Van Gogh para lhe entregar uma carta, mas o artista já está morto. Na tentativa de cumprir sua missão ele começa a investigar os eventos em torno da morte do artista e se percebe numa trama complexa onde cada um parece ter sua versão da verdade.

O que é mais impressionante sobre esse filme é a forma que ele encontrou de usar a arte de Van Gogh dentro da própria história. O filme inteiro é feito como uma pintura viva que emula o estilo do icônico artista. Os atores foram filmados e usando a técnica de rotoscopia; desenhar por cima dos gestos e expressões dos atores, dando uma sensação de realismo para a animação. Imagine as pinturas do próprio Van Gogh se movendo, falando e gesticulando pela tela e se modificando com o passar de cada cena. Foram necessários mais de 100 artistas que fizeram todo esse processo de forma manual. Em momentos onde um dos personagens está narrando um evento do passado o estilo de arte se modifica para um traço que parece ser mais pautado no lápis e no carvão, completamente preto e branco. A simples ideia de fazer um filme inteiro emulando a arte de Van Gogh já é incrível e a execução de tal ideia se deu de forma impecável. Nos primeiros minutos de filme é até difícil prestar atenção na história pelo deslumbramento que o visual causa.

A estrutura do filme se dá muito como um filme de detetive clássico. Um homem fazendo uma série de perguntas para aqueles que conheciam o falecido, e através do relato dessas pessoas vamos montando uma história. O filme inteiro se baseia nesse conceito. Quando estamos no tempo real temos o estilo clássico de Van Gogh e nas narrativas do passado o preto e branco. Talvez o grande problema deste roteiro seja justamente pelo personagem principal não ter uma grande motivação para descobrir a verdade por trás do suicídio do artista. Apesar de o assunto ser naturalmente fascinante, é um pouco difícil acreditar que aquele sujeito gastaria tantos esforços para obter a resposta deste mistério. Os personagens entrevistados foram todos retirados das pinturas de Van Gogh num exercício fabuloso de pesquisa histórica e sagacidade para encaixar cada um deles no roteiro.

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Para aqueles que desejam conhecer mais sobre a vida do pintor este filme é uma obra rima, entretanto não espere ouvir ou ver o próprio falando e agindo ao longo da história. Só obtemos as informações sobre ele através dos relatos de terceiros, o que de certa forma mantém parte do mistério envolto nesta figura histórica. Além de vermos as pinturas clássicas sendo reproduzidas ao longo da história, temos também alguns momentos icônicos da vida de Van Gogh, como o famoso caso da orelha.

Devido ao caráter de investigação os diálogos acabam sendo um pouco repetitivos e geram uma barriga em alguns pontos da história. A própria rotoscopia em si tira um pouco da energia da movimentação dos atores e torna o termo “cada frame uma pintura” em algo um pouco literal de mais para o cinema que exige mais movimentação. Mas de qualquer forma este é um filme incrível, absolutamente sensível, historicamente preciso e uma homenagem belíssima para esse pintor que mudou o mundo, mesmo que não soubesse que isso iria acontecer. Às vezes me pergunto o que ele acharia deste filme caso pudesse vê-lo.

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Raul Martins

Autor dos livros Cabeça do Embaixador e Onde os sonhos se realizam

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