Filmes sobre a passagem da adolescência para a vida adulta já são relativamente comuns. O tema do crescimento é bastante abordado em diversas mídias e sempre fascina por ser um evento que todos precisaram passar para amadurecer. Geralmente, essas histórias sempre falam sobre maturidade, escolhas, mudanças e a autodescoberta. Lady Bird aborda tudo isso e nos conta uma história particular e minimalista.

Com a chegada do fim de seu Ensino Médio, a jovem Lady Bird precisa começar a pensar em que faculdade deseja cursar. O problema é que sua família está passando por uma grande crise financeira, o que limita muito suas escolhas de curso superior. Para piorar, sua relação com a mãe está se degradando devido aos diversos conflitos cotidianos que elas possuem.

Todo adolescente se acha especial. Isso passa pelo sentimento de acreditar que é particularmente muito único ou incompreendido como mais ninguém no mundo é.  Em parte, muitos desses processos ocorrem pois o jovem passa por diversas descobertas simultâneas e começa a construir sua própria personalidade. Para tal construção ocorrer, inicia-se uma distinção do que é bom e ruim e, naturalmente, o que vem da família tende a ser negado. Lady Bird é exatamente assim.

Ela rejeita a figura da mãe e tudo que lhe pareça excessivamente convencional. Tal sentimento acaba se personificando em sua cidade, Sacramento, e tudo o que ela representa. A oposição disso se torna o sonho de ir para uma faculdade em outro estado, onde ela poderia deixar tudo o que era ordinário para trás. A grande sacada deste filme é que sua diretora e roteirista Greta Gerwig tem consciência de que, por vezes, sua protagonista é um pouco ingênua, mesquinha, egocêntrica e cruel e não cria a dicotomia pobre de “jovem artista e incompreendida” VS “pais e escola reacionários e malvados”.  É um filme bastante maduro sobre um período tão imaturo da vida.

Saoirse Ronan dá vida a Lady Bird de forma altamente eficiente e com total naturalidade. Na verdade, ela é tão boa que até sentimos certa raiva quando a personagem começa a tomar atitudes duvidosas e a julgamos quando está sendo adolescente em demasia. O roteiro se centra em contar a vida desta jovem e todos os dramas que esse momento da vida possui. Estou falando aqui do primeiro amor, amizades e sobre descobrir o seu lugar no mundo. O roteiro não possui nenhum grande conflito que coroa o clímax. A proposta é tão realista e simples que não temos grandes dramas que obedecem à estrutura clássica dos três atos. É como se esse filme fosse composto por várias pequenas coisas, causos e questões que compõem a trama geral. Tanto que é possível ficar com a sensação de que algo está faltando no fim da exibição.

Tanto os momentos cômicos quanto os trágicos são bem sutis e até leves, mas a idealizadora sabe extrair deles todo o potencial. Devemos bater palmas também para a atuação de Laurie Metcalf como mãe de Lady Bird, que possui o difícil papel de ser a matriarca firme, questionadora, porém ao mesmo tempo dócil e amável. O mesmo se dá para os outros personagens adultos do filme que nunca caem em vilania e preconceito contra tudo relacionado aos jovens, algo bem típico em filmes de escola.

Lady Bird é um filme delicado. Não é nenhuma revolução contar uma história sobre amadurecimento, mas também não precisa ser. Crescer é um evento particular para cada pessoa e, com esse filme, temos a chance de enxergar o mundo pelos olhos de Greta Gerwig, que tem muito a dizer. É o tipo de obra que atingirá cada pessoa de forma individual, pois depende muito de como foi sua adolescência, de como você passou por ela ou se ainda está vivendo.

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Raul Martins

Autor dos livros Cabeça do Embaixador e Onde os sonhos se realizam

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