Tijolômetro – Nanatsu no Taizai (completo):

Ruim

Em 2014 estreava o anime Nanatsu no Taizai, baseado no homônimo mangá escrito e ilustrado por Nakaba Suzuki. No Brasil alcançou popularidade quando entrou para o catálogo da Netflix com o título The Seven Deadly Sins (Os Sete Pecados Capitais). O anime remonta a época da Britânia das histórias do Rei Artur, com a adição da fantasia medieval comum dos animes, com Reino dos Demônios, Fadas, Elfos, Anjos e Deuses. A produção teve 5 temporadas de 24 episódios cada, contando ainda com alguns OVAs. Uma longa jornada de mais baixos do que altos que exige um esforço hercúleo para que se chegue até o final.

Começamos a história acompanhando Elizabeth, princesa do reino de Lionnes que está a procura do grupo de sete cavaleiros que dão título ao anime, com cada um dos integrantes representando um pecado capital. Com o desenrolar dos episódios vamos descobrindo que Elizabeth e Meliodas – capitão dos Sete Pecados – têm uma história mais longa do que se sugeria no início.

É difícil avaliar em um só texto uma produção que teve 5 temporadas e mais de 100 episódios como Nanatsu no Taizai, mas podemos dizer que a jornada foi muito longa para nós, espectadores. Longa porque o que o anime tinha de positivo nas primeiras temporadas se perdeu completamente a partir da metade final. Todo o humor, tensão, demonstração de poder e personagens que eram até aceitáveis da trama deram espaço a uma correria desenfreada de acontecimentos, flashbacks e lutas sem peso nenhum.

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O anime passou por mudanças de estúdio ao longo do tempo, onde tivemos uma visível piora na arte e qualidade do desenho, inclusive uma tentativa de censura ao derramamento de sangue da produção (o que durou uma temporada). Mas o pior pecado – com licença do trocadilho – de Nanatsu foi o empobrecimento do roteiro. Não que seja o caso de que o anime tinha um ótimo roteiro no início, era bem básico na verdade, mas o fato de conhecermos aquele mundo da Britânia e sermos apresentados aos Sete Pecados de um a um, sem pressa, intercalando lutas muito bem animadas, é o que faz o estilo shonen ser o sucesso que é. Um exemplo de como o início do anime há um esforço de um melhor desenvolvimento de personagens é o fato de sermos apresentados ao Pecado do Orgulho, Escanor, somente na segunda temporada. Ou seja, tivemos a primeira temporada inteira de apresentação dos outros Pecados.

A série também se esforça em trazer momentos de comédia para a trama, e aqui já temos um outro ponto que não desceu bem já desde o início. A personagem Hawk (a porquinha) chega a ser irritante do tanto que grita nos nossos ouvidos, geralmente em situações bem forçadas. Fora toda a problemática que o Ecchi do anime também causa. Sabemos que o ecchi se tornou inclusive uma categoria de anime, e temos outras produções que se apoiam no ecchi para contar suas histórias e se saem muito bem (como High School DxD e Kaifuku), mas em Nanatsu no Taizai chega a ser constrangedor como o anime utiliza deste recurso de forma barata e quase sempre em um tom abusivo entre Meliodas e Elizabeth, um abuso este que é tratado de forma normativa dentro do anime, apesar de nas últimas temporadas haver menos destes momentos.

Apesar dos pesares, Nanatsu no Taizai consegue sobreviver mesmo que cambaleando até a terceira temporada, mais precisamente até a ressurreição dos Dez Mandamentos e seu desenrolar. A partir deste ponto da história é ladeira abaixo com o início da “Guerra Santa”. A obra tem seus piores momentos quando tenta explicar os acontecimentos do passado dubiamente, e acaba utilizando-se disto para trazer mais situações confusas no futuro. E essas repetições é algo corriqueiro no anime. Inimigos e obstáculos de roteiro que são derrotados e ultrapassados, depois reaparecem para ser derrotados e ultrapassados novamente com os protagonistas cometendo os mesmos erros e fragilidades novamente. Parece que os fatos ocorridos durante os episódios não contribuem para a evolução de personagem nenhum, que voltam a cometer os mesmos erros e a enfrentar os mesmos inimigos num ciclo sem fim, até ter uma motivação extra que os fazem se transformar e derrotar mais uma vez seus inimigos. O principal exemplo disto é o King que tem seu ex-amigo como inimigo 2 vezes e como amigo mais outras vezes, e depois tem que enfrentar a irmã de seu amigo mais outras vezes. No fim King já possui 3 variantes de transformação, mas continua quase o mesmo personagem do início do anime, ainda não confiando na relação entre Ban e sua irmã.

Com relação a estas excessivas transformações e variações da escala de poder temos mais problemas ainda. Aqui podemos usar o Meliodas como exemplo, que num primeiro momento tinha dificuldades para enfrentar certos vilões, mas sempre contou com gatilhos para aumentar o seu poder. Uma espada, uma morte, um momento de ira. E dentro desta escalada obstáculos criados para ele no roteiro eram facilmente esquecidos alguns episódios depois, como o fato de a cada vez que ele revive ele perde um pedaço de sua alma. Depois da primeira vez isto volta a acontecer algumas outras vezes, mas esse complicador de perder um pedaço da alma é esquecido convenientemente.

Essas conveniências vão acontecendo com cada um dos personagens com suas próprias especificidades: é o Ban que tem o poder de roubar o poder de outras pessoas mas que se esquece disto a partir de determinado ponto, King que cai sempre em uma situação de se superar para proteger a Diane. Falando na giganta, talvez ela e o Gowther são os que tem as trajetórias de evolução no anime mais corretas, diferentemente de Escanor e Merlin, que tem seus poderes aumentados e técnicas novas de acordo com o desejo do roteirista. Chega num ponto em que a maga do nada mostra um poder de paralizar o tempo no fim da série que nunca tinha usado antes. Tudo numa conveniência exemplar. 

Falando em Merlin, chega a ser lamentável quando o anime de alguma forma referencia as histórias de Artur. Temos o próprio Artur jovem na história, que nada tem a ver com o original, a Merlin numa versão feminina e com poucas roupas, Vivian, Britânia, Excalibur… Tudo parece ser tão forçado para ser referenciado que é até de se entranhar a motivação para tal. Temos inclusive uma Dama do Lago no final da série que se resume a um bizarro lago falante saído absolutamente do nada. E isto é apenas uma agulha no paheiro. Como dito antes, a ladeira é íngrime e profunda da quarta temporada em diante.

A partir da quarta temporada os já escassos pontos positivos do anime são esquecidos. A própria luta contra os Mandamentos se resolvem facilmente, nos perdemos nos critérios de vilania dos mesmos. Uns passam a serem mestres dos Pecados, outros simplesmente somem por episódios. Temos toda a questão de Estarossa ser o Mael de uma forma muito mal explicada e a batalha final envolvendo Cusack, Chandler, Zeldris e, por fim, o Rei Demônio é uma trocação de rajada de poderes sem fim, mas que nada é definitivo. A luta contra o Rei Demônio é a síntese do que é não ser definitivo, totalizando em 3 lutas seguidas, com repetições de acontecimentos enfadonhos, como a luta mental entre Meliodas e do Zeldris contra o Rei Demônio. Geram momentos tão toscos que temos o direito de comparar toda essa sucessão de acontecimentos a uma novelão mexicano, mas sem nenhum peso dramático, com direito até a um pedido de casamento durante a luta final. E isso não é tudo, por fim temos uma nova ameaça barataque surge do nada só para tentar dar algum sentido na existência do Artur na obra e no clima de certo mistério que envolvia a Merlim.

Após 7 anos de sua estreia Nanatsu no Taizai teve o seu fim em 2021. Foi um esforço hercúleo deste que escreve para acompanhar tudo isso na base do “já que cheguei até aqui vou terminar”. Se em algum momento houve algo de positivo em Nanatsu no Taizai no fim do anime ele já está completamente esquecido há muito tempo. Ainda temos o enfadonho filho de Meliodas e Elizabeth com olhos de cores diferentes para representar que é uma mistura entre o clã demônio e o clã das deusas, será que haverá alguma continuação? Aparentemente não! E a nossa vida seguirá feliz com esta resposta. Um fim que tem de positivo apenas retirar um peso de nossas costas, e seguirmos vivendo sabendo que não tem mais episódios para assistir.

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Daniel Gustavo

O destino é inexorável.

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