Atualmente, uma das atrações mais comentadas da Netflix é O Gambito da Rainha (The Queen’s Gambit). A minissérie baseada no livro homônimo escrito por Walter Trevis consegue combinar boa trama e atuações marcantes com um dos jogos de tabuleiro mais famosos do mundo: o xadrez. O resultado dessa mistura foi tão satisfatório que o programa conseguiu realizar a proeza de obter 100% de aprovação no site especializado Rotten Tomatoes.

Na série, acompanhamos a trajetória de Elizabeth Harmon (Anya Taylor-Joy), uma órfã que aprende a jogar xadrez aos nove anos e se mostra um verdadeiro prodígio. Determinada a se tornar uma das melhores enxadristas do mundo, Beth mergulha de cabeça no esporte. Porém, ela precisa enfrentar os próprios vícios e os fantasmas de seu passado se quiser atingir seus objetivos.

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Para quem não está familiarizado com o mundo enxadrista, o título da produção pode causar estranhamento no início, mas seu significado reflete bem do que a minissérie trata. O gambito da rainha é uma abertura do xadrez, onde o jogador que inicia com as peças brancas faz uma sequência de movimentos para montar o seu jogo, muitas vezes sacrificando um peão. A protagonista usa essa estratégia diversas vezes para derrotar seus adversários; porém, indo além do jogo, ela sacrifica muitas coisas na sua vida pessoal para se dedicar ao esporte.

Mesmo que o roteiro gire em torno dos jogos e das competições, qualquer um pode apreciá-lo independentemente de ser fã ou não do xadrez. Para ser bom nesse esporte a um nível competitivo é preciso muito estudo, por mais que a pessoa tenha habilidade natural para jogá-lo. E conseguimos ver toda essa dedicação — na verdade, quase obsessão — em Beth. Até quem não sabe jogar consegue achar as partidas emocionantes, seja pela troca de olhares entre os oponentes ou pela tensão criada entre eles, sem se tornar algo monótono ou repetitivo graças aos recursos visuais utilizados.

Contudo, o sucesso de O Gambito da Rainha não se deve apenas isso. A construção da protagonista é responsável por boa parte da aprovação do programa. Beth é uma jovem dos anos 60 que resolve se aventurar em um ambiente frequentado principalmente por homens. Já era esperado que ela sofresse com o machismo, mas a forma fria e metódica que ela lida com isso a torna uma personagem feminina extremamente forte sem que a trama precise explicar isso de maneira didática.

Mas ainda que ela seja uma mulher de personalidade, não está isenta de problemas. Desde nova, Elizabeth precisa lidar com o vício em calmantes e álcool. Assim, ela trava uma batalha interna cheia de altos e baixos onde os efeitos desses vícios têm impacto direto na sua relação com as pessoas ao redor e no seu desempenho como enxadrista.

Dar vida a uma personagem tão complexa, exigiu de Anya Taylo-Joy uma interpretação intensa, onde ela precisa alternar entre uma pessoa fria e calculista e uma menina perdida no mundo. A atriz já havia mostrado parte de seu potencial em Fragmentado (2017), mas agora ela dá um passo além, representando seu papel de forma impressionante.

Outros personagens tiveram sua dose de importância na jornada da protagonista, tanto para o bem quanto para o mal. Quem merece destaque é Alma Wheatley (Marielle Heller), a mãe adotiva de Beth. As duas têm muitas coisas em comum, inclusive problemas, o que as aproxima bastante. Outro que merece ser lembrado, apesar de aparecer pouco, é o zelador Mr. Shaibel (Bill Camp) que foi quem ensinou a menina a jogar ainda no orfanato e foi o primeiro a demonstrar afeto, mesmo que de um jeito peculiar.

Quanto aos defeitos, não há muitos para serem apontados, só pequenos detalhes que poderiam ter sido melhor explicados e explorados, como a passagem de tempo que se torna confusa algumas vezes e a previsibilidade de alguns acontecimentos. Mas isso não compromete a obra como um todo.

A complexidade da protagonista, a ambientação e o contexto da época e a qualidade do roteiro e do elenco colocam em xeque qualquer tentativa de desmerecer O Gambito da Rainha. Ainda que tome como base um jogo visto por muitos como exclusividade de intelectuais, a minissérie da Netflix tem potencial para conquistar o público geral graças a sua acessibilidade. E parece que já conseguiu isso.

Ficha técnica:

  • Ano de lançamento: 23 de outubro de 2020
  • Gênero: drama, adaptação de livro
  • Criadores: Scott Frank e Allan Scott
  • Direção: Scott Frank
  • Emissora original: Netflix
  • Número de episódios: 7
  • Status: completa
  • Elenco: Anya Taylor-Joy (Elizabeth Harmon), Marielle Heller (Alma Wheatley), Thomas Brodie-Sangster (Benny Watts), Bill Camp (Mr. Shaibel), Harry Melling (Harry Beltik), Jacob Fortune-Lloyd (Townes), entre outros.

Assista ao trailer:

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Crítica sem spoilers de Fragmentado (2017)

 

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Mozer Dias

Engenheiro por formação, mas apaixonado pelo mundo da literatura e do cinema. Se eu demorar a responder, provavelmente estou ocupado lendo ou assistindo a um filme.

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