“Baseado em fatos reais”. Essa frase já é suficiente para que olhemos de forma diferente para qualquer obra, seja um filme ou um livro. No caso da literatura, os chamados romances históricos utilizam fatos e personagens reais para ambientar a ficção e narrar uma trama que não foi contada ou então apresentar um olhar diferente sobre algo que já era conhecido. Em Papisa Joana, a escritora Donna Woolfolk Cross recria a trajetória da única mulher que, ainda na Idade Média, supostamente ocupou o cargo mais alto da Igreja Católica.

A história se passa no século IX, período que ficou conhecido como Idade das Trevas devido à ignorância e à superstição religiosa que dominavam a época. As mulheres não tinham direito a frequentar escolas e eram tratadas como propriedade dos homens. Foi nesse contexto sombrio que Joana resolveu levar a sua vida vestida como homem para realizar seu desejo de estudar. Assim, ela se tornou médica, alcançou posição de prestígio dentro da Igreja e foi eleita papisa. Porém chegar até este ponto não foi fácil. O livro conta o caminho que a ela precisou percorrer, sacrificando muitas coisas para atingir seus objetivos.

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A autora esclarece que a existência de Joana não pode ser comprovada, mas que seu papado era tido como verdadeiro até o século XVII. Foi então que o Vaticano, atacado pelo protestantismo, decidiu apagar qualquer menção à personagem de seus registros. Contudo alguns documentos sobreviveram ao longo dos anos e a partir deles Donna Woolfolk reconstruiu a jornada da papisa.

Por mais que a veracidade da protagonista seja incerta, os personagens e acontecimentos ao redor dela são reais e foram utilizados para justificar alguns episódios da vida da mulher. Donna admite que precisou fazer algumas adaptações e mudar a data de alguns fatos, mas a essência histórica se mantém a mesma. A pesquisa por trás do romance revela como o trabalho foi feito cuidadosamente e sem pressa, mostrando o poder que a ficção tem de complementar a realidade.

Para tornar a narrativa mais atraente e preencher as lacunas do relato sobre a Joana, alguns elementos ficcionais foram acrescentados. Alguns deles são clichê, é verdade, mais ainda assim funcionam para prender a atenção dos leitores. Romances proibidos, traições e maldições são alguns exemplos do que encontramos durante a leitura. Há também um capítulo sobre a Batalha de Fontenoy, que de fato ocorreu, e a invasão dos sarracenos à Roma, contudo até essas passagens ganham outro ângulo.

A única coisa real lamentável, é a forma como a ignorância das pessoas na Idade Média tinha resultados terríveis. Inocentes eram condenados à morte baseando-se em passagens bíblicas mal interpretadas e todo absurdo era justificável por quem tinha algum poder. Entretanto o mais chocante era o tratamento dado às mulheres que passavam por diversas dificuldades. No meio disso tudo, Joana lutava sozinha para mudar sua condição e a de outras como ela, desafiando autoridades e não tendo medo de falar o que pensava, por mais que isso a pusesse em risco.

— Que ela imite o comportamento de um cão, cujos olhos e coração estão sempre voltados para o seu amo; mesmo quando o amo o açoita e atira pedras nele, o cão o segue, abanando o rabo. […] Da mesma forma, uma mulher deve nutrir amor perfeito e incondicional pelo marido. […] Que este homem seja valente como Davi, sábio como Salomão, forte como Sansão. Que suas terras se expandam, assim como sua fortuna. Que ele seja um senhor justo para com sua senhora, nunca administrando nela mais do que castigos razoáveis.” (fala de um padre ao celebrar um casamento)

Independentemente de ser real ou não, Donna Woolfolk Cross consegui transformar a papisa Joana em um símbolo de persistência e força de vontade, mesmo em um período tão obscuro onde atos revoltantes eram cometidos em nome da fé. Ao ler esse romance histórico, vemos que evoluímos bastante de lá para cá, mas também que ainda há muito que precisa ser melhorado.

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Mozer Dias

Engenheiro por formação, mas apaixonado pelo mundo da literatura e do cinema. Se eu demorar a responder, provavelmente estou ocupado lendo ou assistindo a um filme.

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