É comum que os nerds falem mal deste filme, pois ele foi um dos responsáveis por tirar de Star Wars o Oscar de melhor filme de 77. Entretanto, acho que os nerds deveriam olhar para Annie Hall com mais carinho. Aqui acompanhamos os relacionamentos fracassados (outros mais e outros menos) do comediante Alvy Singer que é cheio de paranoias, neuroses e todos os tipos de problemas que todo mundo tem, mas ninguém fala sobre.

Eu já falei desse filme, de relance, no meu texto sobre hispsters no cinema (que você pode ler aqui), mas o que ele tem de tão interessante? Bem a pergunta que deve ser feita é: o que o Woody Allen tem de tão interessante?  Se você gosta de cinema certamente já esbarrou com esse nome por aí, ou um de seus 76 roteiros. O comediante ganhou relevância no meio pelo seu jeito totalmente inovador de olhar o mundo. De modo geral, quando vemos o comediante falando diretamente para o público, no melhor estilo stand-up, a graça é justamente ver como aquela figura vê o mundo e suas observações sobre tudo que o cerca. O que Woody Allen faz em seus filmes é justamente isso.

A primeira cena do filme resume essa ideia. Temos Alvy (que nada mais é do que Woody com uma persona exagerada dele mesmo) dizendo diretamente para o público sobre como ele se enxerga no mundo dos relacionamentos. Em vários pontos do filme ele faz coisas semelhantes em relação à quebra da quarta parede. Algumas vezes ele confessa algo ao público, outras ele faz uma piada e em outras ele simplesmente chora suas mágoas.

“Mas Raul, o filme é exatamente sobre o que?”. De modo simples eu poderia dizer que ele é sobre a vida pessoal do personagem Alvy, principalmente seu relacionamento amoroso com Annie Hall (interpretado por Diane Keaton) onde vemos o mesmo desde sua gênese. Entretanto, o filme vai um pouco além disso. Ele fala sobre ser judeu em Nova York, sobre as diferenças em relação à Califórnia, sobre como é viver de comédia, sobre cinema e todas as coisas que podem passar pela cabeça deste personagem.

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Para pessoas mais reclusas, tímidas e com personalidades mais retraídas, esse filme será um show de representação, pois em diversos momentos do roteiro nós esbarramos com as idiossincrasias de Woddy/Alvy que você e eu temos. Não entrar num filme já começado, ficar com um estômago embrulhado num encontro e sentir raiva de alguém que você nem ao menos conhece baseado em coisas idiotas. Em termos de direção temos momentos verdadeiramente inventivos, onde vemos personagens passeando por suas memórias, cenas intercaladas acontecendo ao mesmo tempo, o que se passa na mente dos personagens enquanto eles falam e diversas outras formas pouco obvias de contar essa história. Mesmo com o avanço do cinema, ainda temos muita coisa em Annie Hall que continua sendo inovadora e inventiva.  A própria quebra da quarta parede já não é mais uma novidade, mas a forma como ela é feita aqui é única e perfeita em seu próprio estilo.

A arte pode ser varias coisas. Uma delas é ver o mundo pelo ponto de vista do artista, e é exatamente isso que os filmes de Woody propõem. Quando você começa a ver diversos filmes desse diretor é possível começar a achar boa parte deles bastante repetitivos e excessivamente cultos às vezes. Até mesmo Annie Hall possui essa característica marcante. Um exemplo: uma personagem após fazer sexo diz: “Foi uma experiência kafkiana”. Por um lado isso pode parecer ambicioso e meio pretensioso demais, mas, por outros, é bom ver um comediante se esforçando para fazer piadas verdadeiramente inteligentes e fora do comum. É melhor uma piada que você não entende e precisa ir atrás de um livro para entendê-la, do que uma piada que você vê chegando cinco minutos antes dela ser feita.


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Raul Martins

Autor dos livros Cabeça do Embaixador e Onde os sonhos se realizam

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