Livros são adaptados para o cinema desde sempre. É muito comum que diversos filmes virem clássicos, mas os livros que deram origem a película original acabam sendo esquecidos.  “E o vento levou”, “Ben- Hur” e até mesmo o icônico “Poderoso Chefão” se iniciaram em livros para depois ganhar as telas. Aqui no Tarja o objetivo desses textos de Filmes VS Livro vai tentar pegar obras que nem todo mundo sabe, ou se lembra, de que nasceram originalmente em livros. Também não faremos o exercício bobo de simplesmente repetir mantras como “o livro é sempre melhor” e efetivamente analisar ambas as obras e encontrar seus pontos de similaridade e onde divergem e se tal divergência é positiva ou negativa dentro do contexto.

Esse é um caso muito interessante, pois tanto o livro quanto o filme são escritos pela mesma pessoa e ainda por cima dirigido. Stephen Chbosky publicou sue livro em 1999 onde ele conta o primeiro ano do ensino médio do personagem Charlie e o início dessa nova fase da vida. Em 2012 ele conseguiu o financiamento para roteirizar e dirigir uma adaptação de seu próprio livro e com um elenco estelar. Logan Lerman, Emma Watson, Ezra Miller e Paul Rudd são os nomes que chamam a atenção quando vemos a história se desenvolvendo na tela. O filme é um sucesso de crítica e acabou se tornado uma espécie de “Clube dos Cinco” do século XXI. Esse é um dos pouquíssimos casos onde não cairemos no problema clássico de um diretor, ou roteirista, ter uma divergência criativa com o autor original da história. Tudo parte da mesma mente criativa.

Vamos começar pelo livro. Charlie é claramente um menino incomum e um tanto problemático. Extremamente introspectivo, sem habilidades sociais e por vezes com certas crises nervosas. O livro é narrado por ele mesmo através das cartas que ele manda para alguém que não conhecemos, mas na verdade não importa por que ele está falando diretamente conosco, o leitor. É interessante que Stephen Chbosky realmente emula como o seu personagem principal escreveria, o que pode ser um pouco estranho num primeiro momento, pois lemos as cartas de um rapaz muito jovem e com certa dificuldade de se expressar. Podemos acabar pensando “Nossa que escrita ruim”, mas além de irmos acostumando com a proposta o próprio personagem vai melhorando conforme o andar da história e os próprios livros que ele vai lendo. De qualquer forma Charlie é muito mais introspectivo na obra escrita. Fica até subentendido que ele poderia ter um tipo de síndrome ou algo que limitaria suas habilidades de lidar com os outros. No filme a atuação de Logan o faz ser mais ativo e um pouco menos desajustado, mas só um pouco. No livro também temos acesso a mais divagações do personagem e algumas parecem ser um tanto não condizentes com sua persona.

Patrick (Ezra Miller) e Sam (Emma Watson) são os melhores amigos de Charlie e são fundamentais para o decorrer da trama. No filme, devido à ótima atuação dos dois atores, eles acabam chamando muita atenção e a história acaba se tornado tanto sobre eles quanto é sobre Charlie. Já no livro eles parecem ser mais secundários, pois como estamos observando tudo do ponto de vista exclusivo de Charlie não temos muito acesso aos seus amigos sem passar pelo filtro de sua visão pessoal, mas isso não os torna personagens menos interessantes. Isso corre também por que no livro somos mais divididos entre a família de Charlie e sua vida no colégio. No filme é dado um foco muito maior no colégio enquanto sua família é bastante secundária. Uma divergência interessante é quanto Stephen Chbosky não teve medo de fazer uso de drogas e sexo de um jeito que muitos diriam “irresponsável”, enquanto no filme o sexo, principalmente, é usado de forma bem específica para o desfecho da obra enquanto as drogas são utilizadas para desenvolvimento de personagem.

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Por outro lado só no filme é que temos uma vertente cômica sutil, principalmente vindo do personagem de Patrick, mas também de algumas situações enquanto no livro isso não ocorre por que o personagem de Charlie não tem um senso de humor muito apurado apesar de ter sacadas ótimas como “provavelmente todo mundo na minha família já ficou doidão, mas ninguém fala sobre isso”. O personagem do professor Anderson é mais ativo no sentido de passar livros para o personagem de Charlie e é uma das coisas mais interessantes. Vamos vendo como ele vai evoluindo conforme os livros que o professor o passa além de uma evolução da própria literatura no sentido cronológico. Por outro lado a interpretação de Paul Rudd torna a figura do professor muito mais cativante e interessante, além da cena onde os dois se conhecem ser incrível e não e existir de forma alguma no livro.

Essa é uma adaptação para o cinema absurdamente fiel, o que não é uma grande surpresa tendo em vista que Stephen Chbosky controlou todas as etapas mais importantes na produção do filme. Ele se permitiu acrescentar algumas cenas e precisou escolher um foco de sua história e dar mais espaço a ela. A escolha de focar no colégio era óbvia, mas mesmo assim ele soube exatamente em como expandir esses momentos sem deforma-los ou mudar suas concepções anteriores. O livro pode ser perfeitamente encarado, para os fãs do filme, como as verdadeiras cartas que Charlie escrevia em algumas cenas. Elas permitiram um mergulho mais profundo na psique desse personagem e alguns momentos a mais dentro da família dele.  Para os fãs do livro é uma dádiva ver uma adaptação que não é só fiel em cenas e falas, mas principalmente no conceito sobre o que é “As Vantagens de Ser Invisível”.

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Raul Martins

Autor dos livros Cabeça do Embaixador e Onde os sonhos se realizam

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