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Quando essa série foi anunciada pela Netflix muita gente ficou confusa, e com razão.  Essa nova série fazia parte da série A Maldição da Residência Hill, já que as séries parecem ter uma identidade visual muito semelhante e ambas são do mesmo criador, Mike Flanagan. Mas a verdade é que não existe nenhuma conexão entre elas, tirando o fato de que ambas se tratam de mansões góticas com fantasmas. O que temos aqui é uma história original, mas que se inspira muito em clássicos literários que trabalham esse conceito.

A história começa quando vemos uma jovem americana chegando na Inglaterra e começando um trabalho de babá em tempo integral numa mansão secular para cuidar de dois órfãos. Ela conhece outros funcionários da casa e aos poucos vai percebendo que existem diversos elementos sobrenaturais em andamento naquele local.

O trabalho que Mike Flanagan vem fazendo é bastante impressionante. Ele vem escrevendo ótimos roteiros para longas como Jogo Perigoso, Doutor Sono, Hush: A Morte Ouve, Espelho e o surpreendentemente bom Ouija: Origem do Mal. No mundo das séries ele nos trouxe a excelente A Maldição da Residência Hill e logo depois cria outra série no mesmo subgênero, mas que consegue trazer coisas novas e manter um nível de qualidade acima da média.

A série em questão é muito mais um drama na maior parte do tempo do que uma série de terror. Os relacionamentos dos personagens e seus traumas são muito mais importantes do que a faceta sobrenatural da trama. O importante é lidar com o luto, a memória e efeitos que aqueles que partem deixam nos vivos. Nesse sentido a série é ótima e consegue criar personagens muito únicos e cativantes.

A atuação é incrível. Acredito que não exista um ator no elenco que não esteja entregando uma atuação minimamente interessante. Até mesmo as duas crianças conseguem entregar o lado infantil de mãos dadas com a faceta sombria e assustadora. Destaques para Victoria Pedretti, T’Nia Miller, Rahul Kohli e Amelia Eve.

O lado terror da trama é bom, mas claramente menos interessante do que vemos em A Maldição da Residência Hill. As vezes o lado sobrenatural é excessivamente explicado e que tira um pouco do clima sombrio dos últimos episódios. Os momentos em que são necessários efeitos especiais (que não são muitos) são péssimos e destroem cenas que deveriam ser sérias e impactantes. Mas apesar disso existem momentos genuinamente assustadores, mas eles estão bem espaçados ao longo dos nove episódios.

Outro problema é que o roteiro entrega alguns mistérios muito cedo e esvazia as cenas de revelação. Seria muito mais interessante ter a epifania da descoberta junto com a protagonista. Por outro lado, a qualidade dos diálogos faz com que tenhamos discussões e retratos sobre relacionamentos abusivos e relacionamentos saudáveis de forma muito mais competente que a maioria das obras que se dedicam inteiramente a isso. Também consegue ser uma história de amor em vários níveis diferentes e realmente de tocar o coração.

Conforme assistia a série me peguei pensando que talvez Mike Flanagan esteja caminhando para algo semelhante ao que Romero fez. Romero se propôs a fazer filmes de zumbis que não eram muito conectados entre si, mas sempre tentavam criar uma nova abordagem dentro desses parâmetros. Flanagan parece estar fazendo algo semelhante, mas com os romances góticos, adaptando-os para a modernidade. Ele já é uma figura que me tornei fã e sempre estarei ansioso para ver o que mais ele tem para entregar. Seu próximo projeto, Midnight Mass, também terá um ar gótico ao mostrar uma vila que começa a presenciar milagres vindo de um pastor misterioso. Mal posso esperar.

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Raul Martins

Autor dos livros Cabeça do Embaixador e Onde os sonhos se realizam

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