Por Vanessa Barros
Na mesma época, a patroa de Marina ofereceu a ela um curso de aperfeiçoamento no qual desenvolveria melhor suas habilidades como manicure. Curso feito, a situação melhorou bastante para Marina e para a patroa. A nova habilidade da funcionária mais carismática do salão era um interessante chamariz de clientes. A agenda da semana lotava já na segunda-feira e isso, com o tempo, tornou-se um problema. Por ter pago o curso, a patroa acreditava que Marina deveria aceitar com gratidão as condições de trabalho oferecidas pelo salão. Mas o sentimento da manicure era outro: por meses já havia trabalhado tanto, chamado tantas clientes, que sua dívida já estava paga fazia tempo. Passou a sentir que carregava o salão nos ombros. Ir para aquele salão trabalhar tornou-se um fardo do qual, tão logo surgisse uma oportunidade, a manicure tornaria-se livre. Fardo este que ficava muito mais pesado a cada dia muito mais em função da forma com que a moça pensava e sentia do que o dia a dia na realidade. Tudo que vinha das colegas e da patroa era ruim, incomodava, dava nos nervos. E de tanto carregar o lugar com pensamentos negativos, chegou o tempo em que o ambiente ficou insuportável. Em casa, os desabafos provocavam aconselhamentos do marido, que, mais ponderado, não concordava com aquela visão pessimista e que, até que tivessem em melhores condições seria sensato ela preservar o emprego por um tempo ainda. Assim ele ia fazendo até que o dia em que o assunto sustentou uma severa discussão. Assim, entendeu o homem que era melhor deixar que ela fizesse o que desejava fazer.
E assim ela fez. Tratou de falar de sua nova forma de atendimento às clientes. Muitas, muitas mesmo, adoraram a ideia. Assim o salão perdeu sua manicure uma semana depois de Marina ter a confirmação de número de clientes que garantiriam o valor mínimo em serviços estabelecido por ela. Chegando em casa, comunicou ao marido que não comemorou mas respeitou a decisão.
A nova rotina de trabalho traria para vida de Marina mudanças das quais ela jamais imaginaria. Conhecer novos ambientes, gente de todo tipo, culturas muito diferentes de seu grupo social mexeriam muito mais com sua cabeça do que poderia considerar quando ainda no salão. Ela sabia muito pouco sobre os novos mundos com os quais teria contato, e sabia menos ainda sobre si mesma. E saber pouco de si é sempre um grande problema. Conhecer realidade social muito diferente da qual estava acostumada mexeu muito com Marina. E o conhecimento de coisas novas impõe questões às coisas velhas. Não que estas venham necessariamente a ser vistas como inferiores. Mas as reflexões sempre surgem. A alegria de viver onde e como, e com quem, a manicure vivia foi se arrefecendo aos poucos.
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Vanessa Barros (MG) é escritora. Autora dos livros Crônicas a Bordo de um Trem Urbano e Crônicas a Bordo de um Trem Urbano – A viagem continua. Para conhecer mais sobre o seu trabalho ouça nossa entrevista com ela no Leituracast 11.