Que a Universal já teve uma era de ouro dos monstros no cinema muita gente já sabe. Ao longo dos anos 30 eles trouxeram para a tela todos os grandes clássicos e definiram o conceito estético do terror por muito tempo. Com a chegada de uma revitalização da Múmia nos cinemas (você pode ler a crítica do novo filme aqui) os olhos se voltam para o passado e relembram de onde veio tudo isso e em que a Universal está se baseando para montar o seu Dark Universe (saiba o que é isso aqui).
No filme de 1932 temos um sítio arqueológico que encontra uma estranha múmia. Ela parece ter sido mumificada viva e os grifos em sua tumba, que seriam proteções para ele na outra vida, estavam riscadas, o que indicava que ela estaria condenada a estar morta em nosso mundo e no pós-vida. Mesmo com muita discussão entre os arqueologos se deveriam abrir a caixa que aparenta ter uma terrível maldição, obviamente, eles abrem e liberam Imhotep para andar novamente pela Terra.
É fácil imaginar que esse é um filme em preto e branco, como todos os outros desta leva, mas não deixe isso te desanimar caso não goste de filmes antigos. O preto e branco é fundamental para a estética da película. Sombras dramáticas, figuras ocultas no escuro e todos os clichês (que não eram clichês na época) são maravilhosamente bem feitos. O filme é visualmente lindo, tanto nos momentos claros e românticos, quanto nos seus momentos macabros. Não é à toa já que o diretor de fotografia é Karl Freund, que trabalhou como diretor de fotografia de Drácula, Metrópoles e no seriado clássico de I Love Lucy.
O roteiro é de Nina Wilcox e Richard Schayer (que também escreveu o roteiro do clássico Frankenstein dessa época) e os dois estão creditados como roteiristas da versão da Múmia de 1999. Faz sentido porque o filme dos anos 90 mantém um plot fundamental que foi colocado no dos anos 30: a Múmia atrás de sua amada em outra vida.
É muito fácil fazer um paralelo com a história do Drácula, que está em busca de sua amada reencarnada através dos tempos. Esse mesmo conceito se repete nessa história. Mais uma vez um elemento que pode parecer clichê, mas era inovador, principalmente na forma como eles colocam no conceito da cultura egípcia antiga.
Como estamos falando de um filme dos anos 30 é necessário apontar alguns detalhes curiosos. A palavra gay é usada logo no início do filme num contexto que não é mais utilizado hoje. Gay era um termo em inglês que utilizado como sinônimo de feliz mais puxado para o sentido de esfuziante. A palavra gay começou a ser usada de forma pejorativa para se referir aos homossexuais e a palavra ficou tão marcada que foi apropriada pelo grupo. Outra coisa que podemos perceber é o black face, que são atores brancos pintados para parecerem pessoas negras. A figura dos negros só aparece para representar subservientes e figuras que serviam aos faraós no Egito antigo, enquanto o próprio faraó é branco. Apesar da cultura clássica do Egito ser um tanto cultuada, o povo que a vivia é totalmente menosprezado. Os deuses, amuletos e hábitos (como o da mumificação) são servidos como coisas exóticas para espantar e colocar medo. O racismo sempre foi algo evidente na história do cinema e o black face uma das práticas que mais marcam esse momento, que acabou virando um grande símbolo do racismo no mundo cinematográfico.
Temos que falar também da figura icônica de Boris Karlof, que também foi o Frankenstein, e até hoje é o ator símbolo do personagem. Ele está incrível nesse papel. No início do filme o vemos aparamentado como Múmia recém-tirada da tumba, onde vemos a incrível maquiagem de Jack P. Pirce que foi um gênio pioneiro no mundo das maquiagens. Essa figura é responsável pelo visual do Lobisomen (1941) e deste filme. Ele está presente em diversos filmes b deste período e criou diversas técnicas que são base para qualquer efeito prático utilizado até hoje.
É um filme curto para os padrões de hoje e vale a pena ser visto mesmo com o ritmo um tanto lento e um final que muitos irão considerar um anticlímax mal feito. Coisa que pode ao final deixar um gosto amargo na boca. Entretanto, é um clássico indispensável para os amantes do terror e daqueles que desejam entender a história do cinema mais a fundo.